Objeto da Posse

Superada as fases anteriores, passamos a tratar do assunto não menos importante neste momento que é o objeto da posse, isto porque, se de um lado alguns doutrinadores entende ser possível à posse de bens imateriais ou incorpóreos, de outro, tem aqueles que, considera a possibilidade de posse apenas de bens móveis, observando que, conforme o professor Caio Mario, há distinção entre os bens incorpóreos, imateriais e a intangibilidade, uma vez que, o segundo o autor citado, é possível que o bem seja imaterial, incorpóreo e ao mesmo tempo tangível, ou ao contrário, que o bem seja corpóreo, material e intangível. Logo, por essa razão, se faz necessário passar por estes longos caminhos teóricos para se chegar aos caminhos práticos e eficazes, de soluções dos reflexos dos bens imateriais ou incorpóreos no Direito Imobiliário.

 

“Só bens corpóreos podem ser objeto de posse; os incorpóreos, não. Os bens intelectuais, como a patente de invenção, o registro de marca ou a obra literária, são objetos do direito de propriedade titulado pelo inventor, empresário ou autor, respectivamente. Mas não cabe falar em posse nesses casos, em razão da imaterialidade do bem em referência. Considera-se que podem ser possuídos unicamente os bens suscetíveis de apreensão material.” [1]

 

Tradicionalmente, a posse tem sido entendida como reportada a coisa material, corpórea. No direito romano, consistia no contato físico com a coisa, o que inviabilizava a sua incidência sobre os direitos pessoais. Esta introdução inicial se faz necessário, em razão de vários apontamentos que se fará a partir dos tópicos subsequentes.

 

O penhor, usufruto, uso, superfície etc., eram denominadas quase posse (quasi possessio), ela semelhança com a posse exercida animus domini, pela semelhança com a posse exercida animus domini. Os direitos reais são criados pelo direito positivo por meio da técnica denominada numerus clausus, e a lei os enumera de forma taxativa, não ensejando, assim, aplicação analógica da lei.

 

Algumas vezes, entre posse e propriedade, o conteúdo “Reflexos dos bens imateriais ou incorpóreos no Direito Imobiliário” tende a se confundir, mas delineando parte a parte, conseguir-se-á concluir, que se trata de institutos diferentes e efeitos jurídicos diferentes.

 

Pode ser usado como exemplo prático deste instituto em comento, o bem de família, que, teoricamente, mesmo estando no gozo de posse mansa, pacífica e continua, poderá exercer os direitos de impenhorabilidade do imóvel, bem como as plantações, as benfeitorias de qualquer natureza e todos os equipamentos, inclusive os de uso profissional, ou móveis que guarnecem a casa, desde que quitados,  por se tratar de um bem de família.

 

Ainda, conforme preleciona o prof. Carlos R. G., 

 

No Brasil, por influência de Ruy Barbosa, os interditos possessórios chegaram a ser utilizados para a defesa de direitos pessoais, incorpóreos, como o direito a determinado cargo. O Governo da República suspendera por três meses, com privação dos vencimentos, dezesseis professores catedráticos da Escola Politécnica do Rio de Janeiro, por se haverem rebelado contra uma decisão do diretor desse estabelecimento de ensino, criando embaraços ao seu regular funcionamento. Esses professores, tendo Ruy Barbosa como seu advogado, requereram e obtiveram um mandado de manutenção de posse para que fossem mantidos no exercício dos seus cargo.”material.” [2]

 

Em alusão ao art. 485 do Código Civil de 1916, correspondente ao art. 1.196 do novo diploma, incluído o vocábulo propriedade, que abrange não só os direitos reais sobre coisas corpóreas, senão também os que recaem sobre coisas incorpóreas, na conceituação do possuidor, muitos juristas adotaram a mesma orientação, argumentava-se que, se a intenção do legislador tivesse sido a de restringir a posse exclusivamente aos direitos reais, teria dito simplesmente que se considera possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes ao domínio, que consiste no direito de propriedade restrito às coisas corpóreas.

 

 É de boa-fé a posse, se o possuidor ignora o vício, ou o obstáculo que impede a aquisição da coisa. O possuidor com justo título tem por si a presunção de boa-fé, salvo prova em contrário, ou quando a lei expressamente não admite esta presunção. Adquire-se a posse desde o momento em que se torna possível o exercício, em nome próprio, de qualquer dos poderes inerentes à propriedade.

 

Acrescenta Beviláqua, citado na obra do professor Carlos R. G., que

 

 “o Código reconhece a posse dos direitos, que consiste na possibilidade incontestável do efetivo exercício de um direito. Como, porém, a posse é estado de fato, correspondente à propriedade, os direitos suscetíveis de posse são apenas os que consistem em desmembramentos dela, os direitos reais, excluída, naturalmente, a hipoteca, porque ela não importa utilização nem detenção da coisa vinculada à garantia de pagamento. Os direitos pessoais são estranhos ao conceito de posse” [3]

 

Em razão das circunstâncias apontadas, surge dificuldades em classificar certos bens como corpóreos ou incorpóreos, surgindo daí a expressão “bens semi-incorpóreos quando se referem a novas espécies que surgiram como decorrência do desenvolvimento científico, tecnológico e cultural do homem, como a energia elétrica, as linhas telefônicas e as ondas de frequência televisivas.

 

E, como resultado dessas divergências, o Superior Tribunal de Justiça, manifesta-se da seguinte forma:

 

“Civil - interdito proibitorio - patente de invenção devidamente

Registrada - direito de propriedade.

- a doutrina e a jurisprudencia assentaram entendimento segundo o qual a proteção do direito de propriedades, decorrente de Patente Industrial, portanto, bem imaterial, no nosso direito, pode ser exercida atraves das ações possessórias.

- o prejudicado, em casos tais, dispõe de outras ações para coibir e ressarcir-se dos prejuizos resultantes de contrafação de Patente de Invenção. Mas tendo o interdito proibitorio indole, eminentemente, preventiva, inequivocamente, e ele meio processual mais eficaz para fazer cessar, de pronto, a violação daquele direito.” (REsp 7196 RJ 1991/0000306-9 - Ministro WALDEMAR ZVEITER , 10/06/1991)

 

 

Por outro lado, mesmo em se tratando de bens imateriais incorpóreos, esse entendimento não é o mesmo para os casos de violação de direitos autorais, uma vez que, conforme a súmula 228, “destaca-se ser inadmissível o interdito proibitório para a proteção do direito autoral.”

 

Para o autor Caio Mario da Silva, o objeto da posse, pode consistir em qualquer bem, aquele que exerce um dos poderes inerentes ao domínio ou propriedade, uma franca alusão a que abrange também os direitos, uma vez que o vocábulo “propriedade” é usado em relação às coisas incorpóreas, enquanto a palavra “domínio” é mais precisa na menção das corporales res. 

 

Em pura doutrina, igualmente, não há empecilho a que a noção de posse abrace tanto as coisas como os direitos, tanto os móveis quanto os imóveis, quer a coisa na sua integridade, quer uma parte dela, podendo ser objeto da proteção possessória, na verdade, tanto as coisas corpóreas quanto os bens incorpóreos ou os direitos, mas, sendo a posse a visibilidade do domínio, os direitos suscetíveis de posse hão de ser aqueles sobre os quais é possível exercer um poder ou um atributo dominial, como se dá com a enfiteuse, as servidões, o penhor. Cumpre, todavia, não confundir, como salienta Lafayette, a enfiteuse e o imóvel sobre que incide: a primeira é um direito real incorpóreo tendo como objeto coisa alheia (ius in re aliena) e se distingue do bem ou coisa corpórea a que adere.18 Tal distinção ajuda a compreender, como no desenvolvimento do assunto se verá, a estrutura do instituto, e principalmente o fenômeno da alienação, por parte do senhorio como por parte do foreiro.

 

É ainda importante destacar como que pode ser objeto de usufruto toda espécie de bens frugíferos, sejam móveis ou imóveis individualmente considerados, sejam bens corpóreos ou incorpóreos, seja um patrimônio todo inteiro ou parte dele como uma universalidade composta de bens corpóreos ou incorpóreos abrangendo-lhe no todo ou em parte os frutos e utilidades. Assim,  fica fácil notar que, o Usufruto em si não é um bem incorpóreo, e sim, um direito real de gozo e fruição, isso porque a lei quis assim, mas que, de outra forma poderá ser composto de bens imateriais ou incorpóreos, sem contudo,perder sua natureza jurídica de direito de real de gozo e fruição.

 

Reflexos dos Bens Incorpóreos no Direito Imobiliário

Conclusão

BIBLIOGRAFIA 

 


 

[1] Coelho, Fábio Ulhoa - Curso de direito civil, volume 4 : direito das coisas, direito autoral -4. ed. SP Saraiva, 2012., p. 25 (O objeto da posse é necessariamente um bem corpóreo. Quando empregada a locução em referência a direitos sobre bens incorpóreos, trata-se de simples analogia)

[2] Carlos R. G. op. C. p. 57

[3] Carlos R. G. , op. Cit. Vl. 5, p. 60 - Para Orlando Gomes, “a razão está com Vicente Ráo quando ensina que os únicos direitos suscetíveis de posse são: a) o domínio;

  1. os direitos reais que dele se desmembram e subsistem como entidades distintas e independentes;
  2. finalmente, os demais direitos que, fazendo parte do patrimônio da pessoa, podem ser reduzidos a valor pecuniário.