Do Bem de Família

A instituição do bem de família é uma forma da afetação de bens a um destino especial que é ser a residência da família, e, enquanto for, é impenhorável por dívidas posteriores à sua constituição, salvo as provenientes de impostos devidos pelo próprio prédio, por isso ser um bem incorpóreo, uma vez que, trata-se de direitos oriundos de bens móveis ou imóveis, corpóreos ou não.

 

“O instituto do bem de família foi introduzido no direito brasileiro pelo Código Civil de 1916, que dele cuidava em quatro artigos (70 a 73), no Livro II, intitulado “Dos Bens”. O Decreto-Lei n. 3.200, de 19 de abril de 1941, também tratou da matéria nos arts. 8º, § 5º, e 19 a 23, estabelecendo valores máximos dos imóveis. Essa limitação foi afastada pela Lei n. 6.742, de 1979, possibilitando a isenção de penhora de imóveis de qualquer valor. O art. 1.711 do Código Civil de 2002 voltou, no entanto, a limitar o valor do imóvel, quando existentes outros também residenciais, a um terço do patrimônio líquido do instituidor.  Os arts. 20 a 23 do mencionado Decreto-Lei n. 3.200 complementavam o Código Civil, disciplinando o modo de instituição e de extinção do bem de família, bem como os procedimentos necessários. Outros diplomas legais também cuidaram do bem de família, como a Lei n. 6.015/73 (Lei dos Registros Públicos, arts. 260 a 265) e o Código de Processo Civil de 1973 (art. 1.218, VI). Posteriormente, adveio nova modalidade de bem de família, imposto pelo próprio Estado por norma de ordem pública (Lei n. 8.009, de 29 de março de 1990), em defesa da entidade familiar. Surgiu assim o bem de família obrigatório, também denominado involuntário ou legal. Segundo Álvaro Villaça Azevedo, “nessa lei emergencial, não fica a família à mercê de proteção, por seus integrantes, mas defendida pelo próprio Estado, de que é fundamento”.    Sobreveio, finalmente, o Código Civil de 2002, que deslocou a matéria para o direito de família, no título referente ao direito patrimonial (arts. 1.711 a 1.722), disciplinando, todavia, somente o bem de família voluntário.[1]

 

Desta forma, Entende-se, que a Lei nº 8.009/1990 reconheceu o bem de família legal e involuntário, mantendo-se em vigor o bem de família voluntário previsto no Código Civil, instituído por meio de escritura pública pela entidade familiar ou por testamento. O Código Civil, no art. 1.711, ressalvou que ficam

“mantidas as regras sobre impenhorabilidade do imóvel residencial estabelecida em lei especial”, o que significa que permanece em vigor a Lei nº 8009/1990.

Ressalta-se ainda que a lei nº 8.009/90 adveio com o intuito de instituir o bem de família legal ou involuntário, objetivando preservar o patrimônio familiar, a impenhorabilidade não só alcança do único imóvel rural ou urbano da família, destinado para moradia permanente, mas, abrangendo a construção, plantação e benfeitorias, bem como box-garagem não matriculada no Registro de Imóveis, os equipamentos de uso profissional e os imóveis que o guarnecerem, desde que, quitados.

Logo, o entendimento que, antes se tinha, era que o devedor solteiro que more sozinho, não terá o benefício dessa lei, que tem por destinatário imóvel residencial de casal ou de família, e sendo uma norma protética da família e não do devedor, não poderia alcançar aquele que vive sozinho.[2]

Em caso de fiança, haverá penhorabilidade da única residência do fiador. Essa lei exclui da impenhorabilidade os veículos de transporte, obras de arte e adornos suntuosos, que poderão, assim, ser objeto de penhora para garantir a execução das dívidas contraídas pelos pais ou pelos filhos. Se a entidade familiar possuir vários imóveis utilizados como residência, a impenhorabilidade recairá sobre o de menor valor, salvo se outro sido registrado, para essa finalidade, na circunscrição imobiliária.

 

“A circunstância de o devedor não residir no imóvel não constitui óbice ao reconhecimento do favor legal. Observe que o art. 5º da Lei 8.009/1990 considera não só a utilização pelo casal, geralmente proprietário do imóvel residencial, mas pela entidade familiar. Basta uma pessoa da família do devedor residir para obstar a constrição judicial. Ressalte-se que o STJ reconhece como impenhorável o imóvel residencial cuja propriedade seja de pessoas sozinhas, nos termos da Súmula 364, que dispõe: "O conceito de impenhorabilidade de bem de família abrange também o imóvel pertencente a pessoas solteiras, separadas e viúvas". Além do mais, é oportuno registrar que essa orientação coaduna-se com a adotada pela Segunda Seção do STJ há longa data, que reconhece como bem de família, inclusive, o único imóvel residencial do devedor oferecido à locação, de modo a garantir a subsistência da entidade familiar.” (EREsp 1.216.187-SC, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, julgado em 14/5/2014).

  

Outra questão importante, é aquela em que o individuo, sabendo-se insolvente, pretenda instituir bem de família ao único imóvel, oras, neste caso, não poderá ser beneficiado, pela lei, uma vez que visa proteger o patrimônio familiar, e se, sabendo insolvente, vier a adquirir de má-fé imóvel mais valioso para transferir a residência familiar, desfazendo-se ou não da antiga moradia, também, não será alcançado pela proteção legal.

 

Assim, se ocorrer tal fato, o magistrado poderá transferir a impenhorabilidade para a moradia familiar anterior, ou anular-lhe a venda, liberando a mais valiosa para execução ou concurso de credores. Se, por ventura, a família residir em imóvel alugado, haverá impenhorabilidade apenas dos bens móveis quitados que guarneçam a residência, desde que pertencentes ao locatário.

 

 

Reflexos dos Bens Incorpóreos no Direito Imobiliário

Conclusão

BIBLIOGRAFIA

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[1] Gonçalves, Carlos Roberto vl. 6 Direito De Família . 11  ed. – SP : Saraiva, 2014. P. 555

[2] Carlos R. G. vl. 6., op. Cit. P. 564, “Malgrado já se tenha decidido que a impenhorabilidade não alcança o imóvel do devedor solteiro, que reside solitário, a jurisprudência tomou outro rumo, passando a admiti-la mesmo quando o ocupante do imóvel reside sozinho.”