Direito Das Coisas e os Bens Incorpóreos

Interpretado pela doutrina, em sentido amplo, coisa é o gênero do qual bem é espécie. É tudo o que existe objetivamente, com exclusão do homem.

Nos ensinamentos do ilustre e saudoso professor Clóvis, citado pelo professor Carlos Roberto,

 

 “a palavra coisa, ainda que, sob certas relações, corresponda, na técnica jurídica, ao termo bem, todavia dele se distingue. Há bens jurídicos, que não são coisas: a liberdade, a honra, a vida, por exemplo. E, embora o vocábulo coisa seja, no domínio do direito, tomado em sentido mais ou menos amplo, podemos afirmar que designa, mais particularmente, os bens que são, ou podem ser, objeto de direitos reais. Neste sentido dizemos direito das coisas”[5]

 

O direito das coisas não está regulado apenas no Código Civil, mas também em inúmeras leis especiais, como as que disciplinam, por exemplo, a alienação fiduciária, a propriedade horizontal, os loteamentos, o penhor agrícola, pecuário e industrial, o financiamento para aquisição da casa própria, Lei de Incorporação Imobiliária, além dos Códigos especiais já citados, concernentes às minas, águas, caça e pesca e florestas, e da própria Constituição Federal.

 

Sendo assim, conceituar o direito das coisas não é tão fácil quanto parece, mas, de forma resumida é, o conjunto de normas que regula o poder dos homens, no aspecto jurídico, sobre os bens e os modos de utilização econômica.

 

É necessário fazer apontamentos em relação aos ensinos do professor Fabio Ulhoa Coelho, que em sua obra prescreve que, 

 

“coisa compreende não só aquilo que tem valor econômico para o ser humano (os bens) como também o que é insuscetível de mensuração pecuniária. De outro lado, coisa significa os bens corpóreos, dotados de existência física, que ocupam lugar no espaço (Beviláqua, 1934, 1:261). Nesse sentido estreito, a expressão alcança apenas uma parte daquilo que tem valor para o ser humano. Não são coisas, aqui, os bens incorpóreos (obra literária, marca registrada, programa de computador etc.) e os direitos (participação em sociedade empresária, direito à vida, crédito etc.)”[9]

 

De forma coerente, como entende alguns doutrinadores, nem sempre a expressão “coisa”, compreende tudo aquilo que é suscetível de valor econômico para o homem, mas somente os bens matérias e corpóreos, como terreno, casa, apartamento, veículo, moedas, minerais, cabeças de gado etc.,  suscetíveis de mensuração pecuniária.

 

Mas de acordo com o doutrinador Fabio, inaplicáveis são os preceitos do Livro do Direito das Coisas a bens incorpóreos ou direitos, a não ser os casos que a lei expressamente admita a aplicação.10 Ainda assim,  não significa, inaplicabilidade absoluta a bens incorpóreos e direitos, das normas de direito das coisas, visto que, poderá encontrar abrigo em leis esparsas, e, esta interpretação está em consonância com a doutrina e legislações. 

 

Porém, de forma acertada, e, ao contrário do doutrinador em comento e, de alguns outros doutrinadores, este não é o mesmo entendimento da professora Maria Helena Diniz, que em sua obra, ao descrever sobre direito das coisas, insere em seus ensinamentos que, tanto os bens materiais (móveis ou imóveis) como os imateriais, compreendem-se no direito das coisas, sendo no caso dos bens imateriais, considerado uma modalidade especial de direito de propriedade.[6]

 

Em decorrência dos argumentos apontados, entre outros, cumpre demonstrar alguns dos bens imateriais ou incorpóreos disciplinados no ordenamento jurídico brasileiro, que seja por força de lei ou por interpretação doutrinária, ainda que seja bem móvel, não perderá a característica de imóvel, e, se não estiver enquadrado como bem imóvel, de alguma forma terá reflexos no campo do direito imobiliário. 

 

Neste passo importa resumidamente citar algumas propriedades imateriais incorpóreas, com exemplo: “o Penhor Industrial ou Comercial” que, constitui-se mediante instrumento público ou particular, registrado no Cartório de Registro de Imóveis da circunscrição.[7]  

 

Pode-se ainda, citar o art. 1.451 do Código Civil, sobre o penhor de direitos que assim preconiza, “Podem ser objeto de penhor direitos, suscetíveis de cessão, sobre coisas móveis.”, 

 

A “Cédula de Crédito Imobiliário CCI” para representar é instituída créditos imobiliários. Sendo o crédito imobiliário garantido por direito real, a emissão da CCI será averbada no Registro de Imóveis da situação do imóvel, 

na respectiva matrícula, devendo dela constar, exclusivamente, o número, a série e a instituição custodiante.[8]

 

A “cessão do crédito” representado por CCI poderá ser feita por meio de sistemas de registro e de liquidação financeira de títulos privados autorizados pelo Banco Central do Brasil.[9] “A cessão de crédito é instituto análogo à compra e venda. Todavia, esta possui como objeto bens corpóreos, materiais, enquanto que a cessão de crédito possui como objeto os bens incorpóreos, imateriais (os créditos)” (Scavone Junior, 2014, p. 361).

 

A “Cédula de Crédito Bancário”, título de crédito emitido, por pessoa física ou jurídica, em favor de instituição financeira ou de entidade a esta equiparada, representando promessa de pagamento em dinheiro, decorrente de operação de crédito, de qualquer modalidade.[10]

 

Antes de esgotar os exemplos, ainda, analisando os bens imateriais ou incorpóreos, faz-se necessário colocar em evidência, alguns outros bens que, pela doutrina, no âmbito do Direito Empresarial, embora sejam classificados ou denominados, como de natureza móvel, poderão também haver repercussões jurídicas no mundo imobiliário. Sendo assim, ainda que tenha por objeto o bem móvel, sem perder a sua natureza originária, ele estará atrelado ao bem imobiliário, ainda que de forma incorpórea ou imaterial, cite-se como ex., um veículo automotor, bem singular, corpóreo e móvel por natureza, mas que, com a Sucessão Aberta, atrelado à herança, torna-se um direito, um bem incorpóreo, um bem imóvel em conjunto com outros bens, denominando-se na acepção jurídica como bem imóvel art. 79, inciso do CC, e uma universalidade de direito pela classificação doutrinária.

 

É importante entender que as coisas coletivas ou universais são as constituídas por várias coisas singulares, que no conjunto, formando um todo único, que passa a ter individualidade própria, distinta da dos seus objetos componentes, que conservam sua autonomia funcional.

 

 Classificando-se em: 

 

  • Uma universalidade de fato, por ser um conjunto de bens singulares, corpóreos e homogêneos, ligados entre si pela vontade humana para a consecução de um fim, via de regra, formado pela vontade humana; e
  • Uma universalidade de direito, constituída por bens singulares corpóreos heterogêneos ou incorpóreos, a que a norma jurídica, com o intuito de produzir certos efeitos, dá unidade, como, p. ex., o patrimônio, a massa falida, a herança e o fundo de negócio, bens protegidos e assegurados pela norma jurídica, que não depende da vontade das partes, mas, sua formação advém da lei.[11]

 

A legislação prevê que, constitui universalidade de direito o complexo de relações jurídicas, de uma pessoa, dotadas de valor econômico. Neste caso, podem ser usados como exemplos, alguns bens que, embora seja classificados pela doutrina como móvel, esses também estarão abrangidos como imóveis, sejam eles corpóreos ou incorpóreos. A herança, o patrimônio, o fundo de comércio, a massa falida etc. O que diferencia a universalidade de fato e a de direito é que a universalidade de fato se apresenta como um conjunto de bens ligado pelo entendimento particular (decorre da vontade do titular), já a universalidade de direito decorre da lei, ou seja, da pluralidade de bens corpóreos e incorpóreos a que a lei, para certos efeitos, atribui o caráter de unidade, como na herança, no patrimônio, na massa falida, etc.[12]

Neste aspecto, fazendo considerações sobre bens imateriais e incorpóreos, destaca-se as instruções a seguir:

 

“Podem ser objeto de penhor direitos, suscetíveis de cessão, sobre coisas móveis. As ações de sociedades anônimas, que são frações do capital social (Lei n. 6.404/76, art. 39, com a redação da Lei n. 9.457/97); as ações de companhias de seguro (Dec.-lei n. 2.063/40, art. 13); as ações de companhias aeronáuticas (Dec.-lei n. 32/66); as ações ou quotas de capital de bancos de depósito (Dec.-lei n. 3.182/41); as patentes de invenções; · ações negociadas em bolsas de valores ou no mercado futuro; · direitos autorais; em alguns ordenamentos, o direito à sucessão aberta; · a os direitos de crédito. Estes últimos constituem a mais importante modalidade do penhor de direito, por serem elementos de grande valia do patrimônio da pessoa de fácil transmissibilidade, de forma que o credor pode oferecer seu direito de crédito como garantia real de dívida que vier a contrair.” [13]

 

 

Cada um dos exemplos apontado, serão analisados posteriormente, para uma melhor compreensão do conteúdo em comento (Reflexos os bens Imateriais ou Incorpóreos), será delineado, um a um no decorrer deste presente trabalho, para que se possa, concluir meios eficazes de solução de problemas e divergências existentes no meio doutrinário e jurisprudencial.

 

Reflexos dos Bens Incorpóreos no Direito Imobiliário

Conclusão

BIBLIOGRAFIA

 

 


 

[5] Carlos R. G., op. Cit., p. 15

[6] vl. 4 - 26. ed., São Paulo: Saraiva, 2011. P. 18.

[7]Constitui-se o penhor industrial, ou o mercantil, mediante instrumento público ou particular, registrado no Cartório de Registro de Imóveis da circunscrição onde estiverem situadas as coisas empenhadas. Podem ser objeto de penhor máquinas, aparelhos, materiais, instrumentos, instalados e em funcionamento, com os acessórios ou sem eles; animais, utilizados na indústria; sal e bens destinados à exploração das salinas; produtos de suinocultura, animais destinados à industrialização de carnes e derivados; matérias-primas e produtos industrializados”.

[8] Arts. 18 e § 5º da Lei nº 10.931/2004; “É instituída a Cédula de Crédito Imobiliário - CCI para representar créditos imobiliários. § 3o A CCI poderá ser emitida com ou sem garantia, real ou fidejussória, sob a forma escritural ou cartular. § 4o A emissão da CCI sob a forma escritural far-se-á mediante escritura pública ou instrumento particular, devendo esse instrumento permanecer custodiado em instituição financeira e registrado em sistemas de registro e liquidação financeira de títulos privados autorizados pelo Banco Central do Brasil. § 5o Sendo o crédito imobiliário garantido por direito real, a emissão da CCI será averbada no Registro de Imóveis da situação do imóvel, na respectiva matrícula, devendo dela constar, exclusivamente, o número, a série e a instituição custodiante.”

[9]Coelho, Fábio Ulhoa - Curso de direito civil : volume 4 — 4. ed. — SP : Saraiva, 2012. p.14

[9] Art. 22. Da Lei Nº 10.931/04. A cessão do crédito representado por CCI poderá ser feita por meio de sistemas de registro e de liquidação financeira de títulos privados autorizados pelo Banco Central do Brasil. § 1o A cessão do crédito representado por CCI implica automática transmissão das respectivas garantias ao cessionário, sub-rogando-o em todos os direitos representados pela cédula, ficando o cessionário, no caso de contrato de alienação fiduciária, investido na propriedade fiduciária. § 2o A cessão de crédito garantido por direito real, quando representado por CCI emitida sob a forma escritural, está dispensada de averbação no Registro de Imóveis, aplicando-se, no que esta Lei não contrarie, o disposto nos arts. 286 e seguintes da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil Brasileiro.

[10] Vl. 4.  op. Cit., p. 14

[10] Lei cit., arts. 26 a 32 e Art. 42. 

[11] DINIZ, Maria Helena. Teoria Geral do Direito Civil . vl. 1 – 29. ed., SP - Saraiva 2012. P. 382

[12] GONÇALVES, Carlos Roberto. Parte Geral – Direito civil brasileiro, volume I –10. ed. — São Paulo:

Saraiva, 2012. P. 278.

[13] Diniz, Maria Helena. Direito das Coisas – Curso de Direito Civil Brasileiro - vl. 4 - 26. ed., São Paulo: Saraiva, 2011. P. 540.